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Metade dos medicamentos na França são inúteis, diz pesquisa
Indústria Farmacêutica contra a Parede - Pesquisa examina 4 mil medicamentos na França e mostra que metade deles são inúteis
Levantamento realizado por pesquisadores franceses mostra que metade de
todos os medicamentos prescritos por médicos na França são inúteis,
20% apresentam riscos aos pacientes e 5% são perigosos. Os autores do
Guia dos Medicamentos, os médicos Philippe Even e Bernard Debré, dedicam
900 páginas para mostrar os resultados de uma avaliação que examinou 4
mil medicamentos e os categorizaram em três diferentes grupos: úteis,
inúteis e perigosos. Segundo Even e Debré, o governo francês
economizaria mais de 10 bilhões de euros ao ano caso retirasse da lista
do sistema de saúde os medicamentos considerados tecnicamente
supérfluos ou que apresentam riscos. Isso ainda poderia prevenir mais
de 20 mil mortes causadas pelo uso de medicamentos e reduzir até 100
mil internações em hospitais.
Em entrevista à revista Le Nouvel Observateur, que dedicou um dossiê de
dez páginas sobre o guia em setembro, Even, que também é diretor do
Instituto de Pesquisa Necker, disse que a publicação se baseia em
informação científica, e que é resultado da análise de milhares de
outras publicações. Uma das substâncias questionadas no guia é a
estatina, usada no tratamento contra o colesterol alto (o LDL,
considerado maléfico em níveis altos no organismo) e aterosclerose. De
acordo com os autores, as estatinas são “engolidas” por 3 a 5 milhões de
franceses e custam cerca de 2 bilhões de euros por ano ao Estado. Para
Even e Debré, esta droga é “completamente desnecessária”. A “lista
negra” ainda inclui anti-inflamatórios e medicamentos usados para
problemas cardiovasculares, diabetes, osteoporose, contracepção, dores
musculares e aqueles que são vendidos para acabar com o vício à
nicotina.
Philippe Even and Bernard Debré (AFP Photo/Daniel Janin/Bertrand Guay) |
A
repercussão do estudo ainda está preservada na França, onde, porém,
tem provocado revolta de médicos e setores da indústria farmacêutica.
Enquanto os autores tentam mostrar o quanto a indústria farmacêutica é a
“mais lucrativa, cínica e menos ética das indústrias”, a Federação
Francesa de Alergia, por exemplo, afirma que “este livro pode provocar
mortes e se baseia em afirmações não comprovadas”. Em outubro, jornais
da França trouxeram a polêmica à tona, com manchetes repercutindo as
listas dos medicamentos inúteis e dos perigosos. O Le Figaro, por
exemplo, dedicou seis reportagens, entre setembro e outubro, para
abordar o estudo. Em uma delas, fala-se em um “livro chocante” e, na
mais recente, já se menciona o “incrível sucesso do Guia de
Medicamentos”.
“O capitalismo tornou-se essencialmente especulativo, visando a
rentabilidade. Gerentes de empresas exigem 20% de rendimento por ano,
condenando-se a políticas de curto prazo absolutamente contraditórias,
com a descoberta de novas drogas, que demandam pelo menos dez anos”,
explicou Philippe Even à Observateur, ao ser questionado sobre a lógica
das indústrias farmacêuticas em relação à criação de novos
medicamentos. Mais adiante, Even completa: “Para ganhar mais dinheiro, a
indústria tem tentado estender a toda França a ampliação das
definições de doenças. E todos nós nos tornamos, assim, os hipertensos,
os diabéticos, ou com hipercolesterolemia, com osteoporose. Os
laboratórios, com o apoio de muitos especialistas, tem aumentado
tratamentos preventivos, dados por 10 a 30 anos, para pessoas
saudáveis, para prevenir doenças que jamais terão”.
Ainda sobre a indústria farmacêutica, Even explica que ela alega que
gasta 5% para a pesquisa, 15% para o desenvolvimento e 10% para a
fabricação, totalmente terceirizada na Índia ou no Brasil. “O setor de
saúde está entre os mais lucrativos. Onde está a moralidade? Ele falha
por um marketing e por um tráfico de influências para os quais investe
nada menos do que 45% do seu volume de negócios”. O dossiê traz, também,
artigos sobre a eficácia contestada dos medicamentos usados para o
combate ao colesterol e a chamada Síndrome de Sissi, um transtorno
descoberto em 1998, na Alemanha. Ele ocorre quando pessoas depressivas
encobrem seu abatimento com um comportamento ativo e positivo diante da
vida.
Em entrevista ao jornal britânico The Guardian , Even disse que a
maioria das drogas criticadas no livro são produzidas por laboratórios
franceses. Ele acusa a indústria farmacêutica de “empurrar” medicamentos
a médicos que, depois, empurra-os para os pacientes. “É como um polvo
com tentáculos que infiltrou todo o poder de decisão de organizações
mundiais de saúde, governos, parlamentos, altas administrações em saúde e
hospitais e da profissão médica”.
Capa da Observateur com dossiê especial sobre o estudo dos médicos franceses |
Segundo o The Guardian, o consumo francês de medicação é de 36 bilhões
de euros por ano, cerca de 532 euros por pessoa que tem uma média de 47
caixas de medicamentos por ano. O Estado cobre 77% do custo. Já na
Inglaterra, o gasto com medicamentos chega a 271 libras por pessoa. Ao
jornal, Even afirma que, ainda na Inglaterra, as pessoas tem a mesma
expectativa de vida do que na França, aproximadamente 80 anos, e não
são menos saudáveis, apesar do gasto ser menor com medicamentos.
"Nos últimos 40 anos os pacientes foram informados de que os
medicamentos são necessários para eles. Então as pessoas pedem por eles.
Hoje temos médicos que querem dar às pessoas medicamentos e pessoas
doentes que pedem medicamentos. Não há nada de objetivo ou realista
sobre isso”, completou Even durante a entrevista.
No site da Observateur, é possível visualizar um infográfico, em
francês, com os 58 medicamentos considerados perigosos, segundo o Guia
de Medicamentos. Clique aqui.
A reportagem completa do The Guardian pode ser acessada aqui.
E as reportagens sobre o levantamento no Le Figaro podem ser acessadas aqui.
Bruno de Pierro, do Brasilianas.org / com agências internacionais
No Advivo
Um comentário:
Muito bom ! Vou dar uma olhada nas matérias que vc cita ( links), mas já enviei para um monte de gente. Sou médica e estou fazendo Pos grad de Gestão em Saúde e esta semana estávamos discutindo justamente o peso que tem na cesta básica de saúde , o custo dos medicamentos.. Aí eu falei que as pessoas se enchiam de remédios que não serviam para porra nenhuma, só pela pressão indecente da industria e pela ignorância / conivência da classe médica ( da qual faço parte , sei exatamente de que estou falando). Bom, com este artigo e com este livro, acho que muita gente vai começar a pensar um pouco mais; afinal o livro foi escrito por estrangeiros, né ? - Se bem que não são americanos... mas serve. Pra brazuca , se é um gringo falando tem mais peso... Um grande abraço
Lais- SP
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