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Antonina, Litoral do Paraná, Palestine
Petroleiro aposentado e petista no exílio, usuário dos óculos de pangloss, da gloriosa pomada belladona, da emulsão scott e das pílulas do doutor ross, considero o suflê de chuchu apenas vã tentativa de assar o ar e, erguido em retumbante sucesso físico, descobri que uma batata distraída não passa de um tubérculo desatento. Entre sinos bimbalhantes, pássaros pipilantes, vereadores esotéricos, profetas do passado e áulicos feitos na china, persigo o consenso alegórico e meus dias escorrem em relativo sossego. Comendo minhas goiabinhas regulamentares, busco a tranqüilidade siamesa e quero ser presidente por um dia para assim entender as aflições das camadas menos favorecidas pelas propinas democráticas.

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

GAZA (OU ELES NÃO PODEM CONTINUAR NASCENDO)

Copiei da página do MST 


São Paulo, 27 de Fevereiro de 2024

Estimados amigos e amigas,

Compartilhamos com vocês o poema de PEDRO TIERRA, em solidariedade ao Povo Palestino, diante do genocídio em Gaza.

Saudações,

João Pedro

XXX---XXX

GAZA (OU ELES NÃO PODEM CONTINUAR NASCENDO)

Hamilton Pereira (Pedro Tierra)


30 mil mortos.

Essa informação cabe num verso?

Metade dos mortos nessa guerra são crianças.

Com que material será escrita a poesia 

desse tempo?

Gaza: 70% dos corpos identificados são mulheres.

Contando as grávidas.

Move-se uma guerra contra o ventre das mulheres palestinas.

Elas não podem continuar nascendo...

Elas não podem continuar nascendo...

Elas não podem continuar nascendo em Gaza.

Elas não podem continuar nascendo em Ramallah.

Eles (os palestinos) não podem 

continuar nascendo.

Oitenta e quatro anos depois de Auschwitz,

move-se diante dos meus olhos de espanto

uma guerra de extermínio contra 

mulheres e crianças.

Move-se diante dos meus olhos gastos

pela contemplação dolorosa da saga

em busca da ressurreição possível

uma guerra contra mulheres e crianças

sobre as areias de Gaza.

?Em Ramá se ouviu uma voz,

muito choro e gemido.

É Raquel que chora

os filhos assassinados

e não quer ser consolada

porque os perdeu para sempre? (Mt.12,18)

(Não serei a voz,

desde o conforto da sombra

que me abriga, nesse ocaso da vida,

que direi aos escravos enfurecidos

como sacudir dos ombros 

a opressão que os esmaga.)

Acender a memória

da explosão do Hotel King David,

22 de julho de 1946 às 12:37.

Jerusalém foi sacudida:

91 mortos. 45 feridos.

Que nome dar a esse ato?

Perguntem a Menachen Beguin.

Hoje, é preciso desenterrar

os deslocados para lugar nenhum.

Os que já não podem retornar

dos escombros, das areias,

das cinzas, do vento que sopra

sobre a memória de Gaza.

Por onde andará Islam Hamed?

É preciso reacender sobre sua ausência

a luz do sol bombardeada

na tarde de ontem.

E perguntar ao coração das bombas:

que destino aguarda um milhão e meio

de palestinos acantonados em Rafah?

Escombros nas ruas.

Escombros de corpos.

Escombros nas almas.

?Ficou muito irado e mandou massacrar,

em Belém e nos seus arredores,

todos os meninos de dois anos para baixo,

conforme o tempo exato

que havia indagado aos Magos. (Mt,12-16)

Não há luz no Hospital Al-Shifa

que permita fazer uma sutura

nos corpos destroçados

pelos bombardeios.

Uma sutura no corpo da Palestina:

haverá uma geração de mutilados

condenados a mirar sem ternura

na dor aguda dessa perna que falta,

na pele que já não protege

a carne exposta,

as digitais de Benjamin Netanyahu.

Recolho o espanto e me afasto

enquanto ouço a voz rouca

que emerge do sul e parte em pedaços

os espelhos cegos da indiferença do mundo...


Brasília, dez. 2023/ fev. 2024.


Pedro Tierra (Hamilton Pereira) é poeta. Ex-presidente da Fundação Perseu Abramo


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