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Antonina, Litoral do Paraná, Palestine
Petroleiro aposentado e petista no exílio, usuário dos óculos de pangloss, da gloriosa pomada belladona, da emulsão scott e das pílulas do doutor ross, considero o suflê de chuchu apenas vã tentativa de assar o ar e, erguido em retumbante sucesso físico, descobri que uma batata distraída não passa de um tubérculo desatento. Entre sinos bimbalhantes, pássaros pipilantes, vereadores esotéricos, profetas do passado e áulicos feitos na china, persigo o consenso alegórico e meus dias escorrem em relativo sossego. Comendo minhas goiabinhas regulamentares, busco a tranqüilidade siamesa e quero ser presidente por um dia para assim entender as aflições das camadas menos favorecidas pelas propinas democráticas.

sábado, 30 de junho de 2012

Um Congresso que debate “cura para gays”: mais um capítulo da teocracia brasileira

Quem arrisca sua saúde neste espaço fedorento conhece, de um lado, a minha posição em relação a imundície que se reúne na abjeta Frente Parlamentar Evangélica e, de outra banda, também já viu por aqui minhas críticas ao governo e ao PT, os quais, de forma despudorada, acocoraram-se diante desta tropa letal de fundamentalistas religiosos. 
A LGBTT-fobia tem origem no discurso religioso, repetido todos os dias, sempre com voz macia e sestrosa e gestos suaves, e precisa ser combatida, e com muito barulho, porque o discurso de ódio e de intolerância estabelece, a meu ver, uma espécie de aceitação social da violência mortal que atinge o povo LGBTT e que, portanto, ameaça a vida do meu filho e minha família.
De minha parte as coisas serão sempre assim: LGBTT-fobia eu trato a pontapés e do pescoço pra baixo é canela, seus filhos da puta!  
Este texto de Idelber Avelar trata com muita propriedade desta questão.

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Copiei de Idelber Avelar

30/06/2012 | Publicado por idelberavelar

Procurei bastante por aí, mas não encontrei. Até onde pude averiguar, não há precedente moderno, em nação democrática, de um Congresso Nacional prestando-se ao ridículo papel de discutir “cura para homossexuais”. Você encontrará, claro, deputados individuais dando declarações que sugerem “cura para gays”, como é o caso do homofóbico costarriquenho Juan Orozco. Mas não consegui achar, em casa legislativa de país democrático, um vexame comparável ao que se prestou a Câmara dos Deputados brasileira nesta quinta-feira. A Câmara se reuniu para um “debate”, uma audiência pública da Comissão de Seguridade Social e Família, acerca de um pedaço de lixo, em forma de Projeto de Decreto Legislativo, defecado por João Campos, evangélico tucano de Goiás e homofóbico-mor do Congresso. O projeto se arroga o direito de sustar uma resolução do Conselho Federal de Psicologia que, com muito atraso, em 1999, definiu que os profissionais da área não patologizarão práticas homoeróticas e não colaborarão com serviços e eventos que proponham tratamento e cura da homossexualidade. Como notou Antonio Luiz Costa, da Carta Capital, mais esdrúxulo ainda é que o pseudo-debate, pasmem, foi convocado por um deputado do Partido Verde.
O estado de exceção em que vivemos se converteu em regra a tal ponto que uma monstruosidade dessas é discutida como se se tratasse de um debate razoável, com duas ou mais posições em comparável condição de reinvindicar a razão ou a verdade. O fato é noticiado como se não fosse absurdo. Votações online colocam as opções como se se tratasse de uma escolha entre termos simétricos, e não a justaposição entre uma posição consensualmente científica e um delírio de psicopatas fundamentalistas. No mundo realmente existente, claro, não há qualquer discussão, em nenhuma disciplina séria, sobre se a homossexualidade é ou não é doença, desvio, aberração ou anormalidade a ser curada. Num país em que se assassina um gay ou lésbica (ou cidadã[o] confundido[a] com gay ou lésbica) a cada 36 horas – lembrando sempre que esses números são brutalmente subrreportados –, aceitar um “debate” nesses termos já é, por definição, sujar as mãos de sangue.
É evidente que, no interior de uma sociedade homofóbica, a violência real e simbólica perpetrada contra gays e lésbicas produzirá sofrimento que, em maior ou menor grau, poderá ter consequências que se encaixam entre as tipicamente tratadas num consultório de psicólogo, psicanalista ou terapeuta. Também é evidente que, nesses casos, o que será tratado ou “curado” – e há toda uma discussão sobre o que essa palavra pode significar, seu clássico sendo o Análise Terminável e Interminável, de Freud – não será, jamais, o desejo, a afetividade ou a prática homoerótica em si, e sim a condição produzida no sujeito, seja lá ela qual for, a partir da violência homofóbica. A Resolução de 1999 do Conselho Federal de Psicologia simplesmente estabelece, como parâmetro ético inegociável para o exercício da profissão, o reconhecimento desse fato, em conformidade com resolução análoga da Organização Panamericana de Saúde.
Há que se atentar que a iniciativa homofóbica dos Deputados João Campos (PSDB-GO) e Roberto de Lucena (PV-SP) vem, toda ela, embrulhada no discurso da liberdade de expressão.  “Deixa a pessoa ter o direito de ser tratada”, diz a pseudo-psicóloga homofóbica Marisa Lobo, estrela do “debate” e convidada de Gleisi Hoffmann a eventos oficiais no Palácio do Planalto (enquanto a tropa de choque governista nas redes sociais inventa cada vez mais malabarismos para dizer que o governo não tem responsabilidade no surto de assassinatos homofóbicos). A baliza ética expressa na resolução do CFP e universalmente aceita entre profissionais de todas as psicoterapias – a saber, a de que homossexualidade não é doença a ser “tratada” – é apresentada por João Campos nos seguintes termos: “É como se o Conselho Federal de Psicologia considerasse o homossexual um ser menor, incapaz de autodeterminação”. No mundo realmente existente, claro, é o jovem gay de 15 anos de idade, e não a corja fundamentalista, que é morto a pauladas na rua. Mas os nossos Deputados acham que é o seu ódio que ainda está sendo cerceado em seu direito de expressão.
Alguns amigos acharam que minha ênfase, ao longo desta sexta-feira no Twitter, no ineditismo desse fato – um Congresso nacional discutindo o direito de se “curar” gays – era contraproducente. Discordo. É importante afirmar: barbárie como esta que está acontecendo no Brasil é raramente encontrada em sociedades democráticas modernas. O evento desta quinta-feira no Congresso é mais uma reiteração dessa barbárie. A única postura que cabe em relação a esse “debate” é denunciar sua própria existência.

Um comentário:

Rosilene Carvalho disse...

http://www.usinadeletras.com.br/exibelotexto.php?cod=44291&cat=Artigos&autor=F%E9lix+Maier