Copiei do Claudio Ribeiro
Cumprindo a promessa de ontem, tento falar em linguagem menos técnica sobre as questões que envolveram a atitude da Câmara Federal na revogação, por inconstitucionalidade, do Decreto Presidencial que regulava Participação Popular nas relações democráticas com o Estado Brasileiro. Há sempre a intenção e o gesto e não sei, por isso, se consegui traduzir a irracionalidade da atitude da Câmara Alta em linguagem simples. Se ainda permanecerem dúvidas, disponho-me a esclarecê-las.
O Decreto 8.243 foi considerado inconstitucional pela Câmara Federal sob o pretexto de que a Presidência da República estaria, com exorbitância, invadindo competência privativa do Poder Legislativo.
O Congresso agiu dentro dos limites do seu poder, porque pode sustar, para além de qualquer dúvida, atos normativos (e o decreto é um ato normativo) do Executivo. A questão central, no entanto, não é esta.
Ao enquadrá-lo na inconstitucionalidade valeu-se a Câmara de argumentos que podem ser assim resumidos:
a) – O Plano Nacional de Participação Social deveria ser instituído por Lei, ou seja, através do Congresso Nacional para garantia da separação dos poderes como estrutura básica da Democracia;
b) - Como foi estabelecido por Decreto, este ato do Executivo seria ilegal porque transferiria a conselhos, instâncias e mecanismos de participação popular poderes que o Congresso classifica como privativamente seus e intransferíveis.
Esses supostas justificativas são tão vazias que sucumbiriam à primeira indagação: Se o Congresso Nacional considera-se titular absoluto da atividade legislativa, por que não regulamentou, até hoje, a Participação Social, instâncias de exercício da democracia direta preconizada, por exemplo, o parágrafo único, do artigo 1º, da Constituição Federal que, de forma expressa, clara, inequívoca, dispões: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”
O poder, nascido do povo, tanto deve ser exercido através da representação, como através de atuação direta do povo. Ou será que a palavra ‘diretamente’ está ali no dispositivo constitucional apenas como enfeite? Ora, se a nossa Democracia garantisse poder apenas aos representantes eleitos, ao povo sobraria única e exclusivamente ao direito de votar e ser votado e isto, sim, significaria negação do sistema constitucional.
Quando Conselho Nacional de Justiça firmou Resolução proibindo o nepotismo, o Congresso Nacional também qualificou o ato de inconstitucional, alegando que caberia somente a si, e de forma privativa, a competência para regular a matéria. O Excelso, depois, convalidou a resolução do CNJ e o nepotismo começou a ser combatido.
Por que o Decreto Presidencial recebeu o carimbo da inconstitucionalidade na semana seguinte às eleições?
A primeira constatação é constrangedora: O Congresso Nacional agiu por mesquinho revanchismo de um Deputado que havia perdido das eleições para governador de seu Estado. A sua condição de presidente da Casa permitia-lhe promover a votação e ele, derrotado nas urnas, deu o vergonhoso ponta-pé para, na esteira do ódio dos perdedores, desfazer um mero regulamento de participação do povo em Conselhos, alguns existentes há longos anos.
A Constituição Federal (artigo 14) prevê alguns meios de participação popular no processo legislativo: plebiscito, referendo e promover uma lei através da coleta de assinaturas e, por esta razão, estes três mecanismos são submetidos a algumas regras legais para serem realizados. As demais vias de participação popular nas políticas do Estado brasileiro não estavam subordinadas a nenhuma reserva legal, nem estavam regulamentadas. O Decreto se destinava somente a definir e dar formatação a essa participação popular concreta, direta e imediata na construção de um Estado Democrático de Direito sob o princípio republicano.
A proibição do nepotismo e a criação de meios de participação popular nos assuntos públicos de interesse geral poderiam ter sido regulados pelo Poder Legislativo; entretanto, se este se omite, foge da sua obrigação e abandona sua legitimidade democrática para legislar sobre essas matérias, com quais fundamentos morais pode julgar inconstitucionais os atos normativos emanados do Conselho Nacional de Justiça e da Presidência da República?
Convém então trazer à memória o artigo 84, VI, da Carta da República que, sem deixar sombras de dúvidas, não exige a aprovação de uma lei para dispor sobre organização e funcionamento da administração pública federal, autorizando, portanto, o Executivo a fazê-lo por decreto, apenas sujeitando-o a dois condicionamentos:
a) - não pode criar ou extinguir órgão público e
b) - não pode, também, aumentar a despesa.
Ninguém mais que o povo tem interesse na defesa de direitos fundamentais e na prestação qualificada de serviços públicos; portanto, ao alijar do povo o direito de exercer o poder constitucional de participar de forma organizada e lícita das políticas sociais de Estado, a Câmara Federal demonstrou, neste episódio, a sua profunda rejeição, quase repugnância, ao povo que a elegeu.
A revogação do Decreto Presidencial nº 8.243 concretiza, portanto, repulsa à convivência entre instâncias diretamente organizadas pelo povo e instâncias burocráticas de exercício de poder e, mais que isto, a decisão da Câmara revela uma acintosa demonstração de desobediência a preceito constitucional para obstruir canais de participação popular direta, ‘vinda de baixo’, para aprimorar a gestão pública, reforçar a dimensão democrática e de transparência que deve ser a tônica do exercício do poder em regimes democráticos.
Quem se utiliza da expressão ‘bolivariano’ para carimbar os Conselhos Populares quer, na realidade, ver o povo o mais distante possível dos poderes dele emanados e, ainda, excluído das relações inerentes à Democracia.
Cumprindo a promessa de ontem, tento falar em linguagem menos técnica sobre as questões que envolveram a atitude da Câmara Federal na revogação, por inconstitucionalidade, do Decreto Presidencial que regulava Participação Popular nas relações democráticas com o Estado Brasileiro. Há sempre a intenção e o gesto e não sei, por isso, se consegui traduzir a irracionalidade da atitude da Câmara Alta em linguagem simples. Se ainda permanecerem dúvidas, disponho-me a esclarecê-las.
O Decreto 8.243 foi considerado inconstitucional pela Câmara Federal sob o pretexto de que a Presidência da República estaria, com exorbitância, invadindo competência privativa do Poder Legislativo.
O Congresso agiu dentro dos limites do seu poder, porque pode sustar, para além de qualquer dúvida, atos normativos (e o decreto é um ato normativo) do Executivo. A questão central, no entanto, não é esta.
Ao enquadrá-lo na inconstitucionalidade valeu-se a Câmara de argumentos que podem ser assim resumidos:
a) – O Plano Nacional de Participação Social deveria ser instituído por Lei, ou seja, através do Congresso Nacional para garantia da separação dos poderes como estrutura básica da Democracia;
b) - Como foi estabelecido por Decreto, este ato do Executivo seria ilegal porque transferiria a conselhos, instâncias e mecanismos de participação popular poderes que o Congresso classifica como privativamente seus e intransferíveis.
Esses supostas justificativas são tão vazias que sucumbiriam à primeira indagação: Se o Congresso Nacional considera-se titular absoluto da atividade legislativa, por que não regulamentou, até hoje, a Participação Social, instâncias de exercício da democracia direta preconizada, por exemplo, o parágrafo único, do artigo 1º, da Constituição Federal que, de forma expressa, clara, inequívoca, dispões: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”
O poder, nascido do povo, tanto deve ser exercido através da representação, como através de atuação direta do povo. Ou será que a palavra ‘diretamente’ está ali no dispositivo constitucional apenas como enfeite? Ora, se a nossa Democracia garantisse poder apenas aos representantes eleitos, ao povo sobraria única e exclusivamente ao direito de votar e ser votado e isto, sim, significaria negação do sistema constitucional.
Quando Conselho Nacional de Justiça firmou Resolução proibindo o nepotismo, o Congresso Nacional também qualificou o ato de inconstitucional, alegando que caberia somente a si, e de forma privativa, a competência para regular a matéria. O Excelso, depois, convalidou a resolução do CNJ e o nepotismo começou a ser combatido.
Por que o Decreto Presidencial recebeu o carimbo da inconstitucionalidade na semana seguinte às eleições?
A primeira constatação é constrangedora: O Congresso Nacional agiu por mesquinho revanchismo de um Deputado que havia perdido das eleições para governador de seu Estado. A sua condição de presidente da Casa permitia-lhe promover a votação e ele, derrotado nas urnas, deu o vergonhoso ponta-pé para, na esteira do ódio dos perdedores, desfazer um mero regulamento de participação do povo em Conselhos, alguns existentes há longos anos.
A Constituição Federal (artigo 14) prevê alguns meios de participação popular no processo legislativo: plebiscito, referendo e promover uma lei através da coleta de assinaturas e, por esta razão, estes três mecanismos são submetidos a algumas regras legais para serem realizados. As demais vias de participação popular nas políticas do Estado brasileiro não estavam subordinadas a nenhuma reserva legal, nem estavam regulamentadas. O Decreto se destinava somente a definir e dar formatação a essa participação popular concreta, direta e imediata na construção de um Estado Democrático de Direito sob o princípio republicano.
A proibição do nepotismo e a criação de meios de participação popular nos assuntos públicos de interesse geral poderiam ter sido regulados pelo Poder Legislativo; entretanto, se este se omite, foge da sua obrigação e abandona sua legitimidade democrática para legislar sobre essas matérias, com quais fundamentos morais pode julgar inconstitucionais os atos normativos emanados do Conselho Nacional de Justiça e da Presidência da República?
Convém então trazer à memória o artigo 84, VI, da Carta da República que, sem deixar sombras de dúvidas, não exige a aprovação de uma lei para dispor sobre organização e funcionamento da administração pública federal, autorizando, portanto, o Executivo a fazê-lo por decreto, apenas sujeitando-o a dois condicionamentos:
a) - não pode criar ou extinguir órgão público e
b) - não pode, também, aumentar a despesa.
Ninguém mais que o povo tem interesse na defesa de direitos fundamentais e na prestação qualificada de serviços públicos; portanto, ao alijar do povo o direito de exercer o poder constitucional de participar de forma organizada e lícita das políticas sociais de Estado, a Câmara Federal demonstrou, neste episódio, a sua profunda rejeição, quase repugnância, ao povo que a elegeu.
A revogação do Decreto Presidencial nº 8.243 concretiza, portanto, repulsa à convivência entre instâncias diretamente organizadas pelo povo e instâncias burocráticas de exercício de poder e, mais que isto, a decisão da Câmara revela uma acintosa demonstração de desobediência a preceito constitucional para obstruir canais de participação popular direta, ‘vinda de baixo’, para aprimorar a gestão pública, reforçar a dimensão democrática e de transparência que deve ser a tônica do exercício do poder em regimes democráticos.
Quem se utiliza da expressão ‘bolivariano’ para carimbar os Conselhos Populares quer, na realidade, ver o povo o mais distante possível dos poderes dele emanados e, ainda, excluído das relações inerentes à Democracia.
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