Copiei do Maria da Penha Neles
Nova legislação pode dar base legal a desmatamento em todo o país
Sob a expectativa de ambientalistas, movimentos sociais e do agronegócio brasileiro, a Câmara dos Deputados vota a polêmica lei sobre o novo Código Florestal. Aprovado pela Câmara em 24 de maio de 2011, o projeto recebeu no Senado um substitutivo do senador Jorge Viana (PT) e agora será reavaliado.
Manifestação na Esplanada dos Ministérios contra a
aprovação do novo Código Florestal - Foto: Wilson Dias/ABr
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Se
aprovado, o documento segue para a sanção da presidenta Dilma Rousseff
(PT) e, caso sancionado, deve impor um retrocesso sem precedentes do
ponto de vista socioambiental no Brasil. A análise é de organizações
civis, movimentos sociais do campo e de setores da comunidade científica
como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e
Academia Brasileira de Ciência (ABC).
O
Código Florestal regula as porcentagens de vegetação nativa que devem
ser mantidas em cada propriedade privada. A ideia fixada em lei é que as
florestas nativas são um bem comum a todos os brasileiros, e que por
isso devem ter diretrizes para a sua exploração e manutenção. O primeiro
Código do país data de 1934. O segundo, em vigor até o momento, é de
1965.
Segundo
a doutora em geografia pela Universidade de São Paulo (USP), Regina
Araújo, nenhum dos dois códigos impôs tanta perda de biodiversidade e
descaso com o meio ambiente como o projeto de lei de agora. “O novo
Código vai consolidar situações irregulares. O impacto será deixar de
recuperar vegetação nativa já desmatada, ou seja, deixaremos de
recuperar um mal já feito. Terá impactos enormes, principalmente na
região Norte”, analisa.
APPs sob ameaça
Dentre
todos os descasos que podem passar a vigorar em forma de lei há um que é
a menina dos olhos da bancada ruralista no Congresso: a redução das
Áreas de Preservação Permanente (APPs) ou sua regulamentação a partir
dos estados. Essas áreas evitam o assoreamento de rios e contribuem para
o equilíbrio térmico e biológico do local. Restingas, dunas, mangues,
vegetação ao longo de rodovias, em terras indígenas e que protegem
espécies ameaçadas de extinção são todas consideradas como áreas de
preservação permanente. Mas na lógica do setor empresarial são um
entrave ao aumento da produção no campo.
De
acordo com o novo Código Florestal, a obrigatoriedade de APPs nas
margens de rios cairá de 30 metros para 15 metros. No caso de rios com
mais de 10 metros de curso de água, o máximo de preservação chegará a
100 metros – contra os 500 metros previstos na legislação atual.
As
encostas com inclinação de 25 a 45 graus também estarão liberadas para o
pastoreio de gados. A mesma coisa vale para atividades agropecuárias e
de cultivo exercidas na beira de rios, nascentes e morros. Basta que os
proprietários comprovem que exerciam a atividade até julho de 2008 para
que a situação para regularizar a situação.
Além
disso, o governo exigirá a recomposição de apenas metade da APP
desmatada, dando ao agricultor a possibilidade de recompor o local com
vegetação nativa ou exótica. A opção economicamente mais rentável deve
ser a plantação de eucaliptos, que poderão ser comercialmente explorados
depois de crescidos.
“Temos know-how na
área ambiental. Poderíamos evitar essa flexibilização de critérios”,
avalia Kenzo Jucá, analista de Políticas Públicas da WWF. Segundo ele, a
mudança na lei irá beneficiar principalmente os maus cumpridores dela.
“Poderíamos ter um programa de regularização sem colocar a faca no
pescoço do produtor para corrigir uma ou outra situação, mas também sem
promover uma lei antipedagógica que ignora o meio ambiente”.
Em
relação às reservas legais, o substitutivo também regulamentou que
estados com mais 65% do território com reservas ambientais, como é o
caso do Acre, poderão desmatar até 50% de áreas consideradas vitais para
a conservação da biodiversidade local. E que reservas desmatadas até
julho de 2008 também poderão ser recompostas com vegetações exóticas.
Perdão bilionário
Outro
ponto bastante polêmico mantido pelo substitutivo do Senado é a anistia
a agricultores e produtores rurais que desmataram ilegalmente. Para
serem perdoados, será preciso que se inscrevam em um programa de
regularização ambiental e comprovem que as atividades ilegais foram
realizadas até 22 de julho de 2008.
Há
estimativas de que sejam anistiadas 75% das multas acima de R$ 1 milhão
aplicadas entre 2006 e 2008 pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). Com isso, o Brasil deverá
perder em divisas R$ 492 milhões. Somadas todas as multas que poderão
ser perdoadas, o país deixará de ganhar R$ 8,4 bilhões, o equivalente a
15% do orçamento destinado para a Saúde em 2012. “É muito dinheiro. Por
isso, tanta mobilização do agronegócio”, destaca Regina Araújo. A
presidenta Dilma Rousseff prometeu não anistiar desmatadores, durante a
campanha eleitoral de 2010.
A
mesma anistia vale para quem desmatou áreas de reserva legal em
propriedades de até quatro módulos fiscais e que podem ser consideradas
pequenas propriedades. “Mas até na hora em que aparece o termo
‘agricultura familiar’, o projeto mascara o problema”, afirma o
engenheiro florestal e integrante da Via Campesina, Luiz Zarref.
Segundo
ele, a estrutura fundiária brasileira tem muitas propriedades compostas
de pequenos imóveis. “A concentração brasileira é assim: alguns
investidores ou latifundiários compram as terras dos pequenos, juntam
matrículas e fazem um imóvel”, pontua Zarref, ressaltando que o texto
favorece fundamentalmente grandes produtores.
Para
ele, o que está em jogo é a necessidade de mais terras férteis para o
mercado. “O avanço que o sistema capitalista imprime exige o consumo dos
recursos naturais. No Senado, foi criado um falso consenso de que seria
um texto bom, que rebatia a essência do projeto da Câmara, mas os
principais problemas se mantiveram”.
No Brasil de Fato
Um comentário:
O que me deixa mais indignada é que ainda não temos estudos suficientes pra definir a área de uma APP, por exemplo. Enquanto os cientistas tentam entender nosso meio ambiente, afim de subsidiar novas políticas ambientais inteligentes, nossos representantes cortam nossos financiamentos de pesquisa, cortam concursos para novos cientistas e ainda aprovam um projeto de lei que favorece o extermínio do nosso objeto de pesquisa. Não sabemos fazer bom uso dos nossos recursos naturais, e antes que os cientistas consigam entender os fenômenos da natureza, afim de sugerir um melhor uso destes recursos, tudo estará acabado. O Brasil está cometendo um crime contra a humanidade, e favorecendo a auto-extinção da espécie.
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