Copiei de Luis Nassif
Por Marco Antonio L.
No Direto da Redação
Mair Pena Neto
Em 1975, Gilberto Gil, que acaba de completar 70 anos, lançou um
belíssimo disco, de nome Refazenda, no qual incluiu uma canção chamada
Pai e Mãe, em que demonstra seu afeto pelos dois e a influência que
exercem em sua vida. Em determinado momento, Gil pede à mãe que diga ao
pai que não se aborreça com ele quando o vir beijar outro homem
qualquer. E completa: “Diga a ele que eu quando beijo um amigo/Estou
certo de ser alguém como ele é/Alguém com sua força pra me
proteger/Alguém com seu carinho pra me confortar/Alguém com olhos e
coração bem abertos pra me compreender”.
A necessidade de o poeta pedir à mãe que explicasse ao pai o
significado do beijo do filho em outros homens fazia total sentido por
se tratar, o pai, de uma pessoa provavelmente da primeira década do
século 20, que poderia se surpreender e ter dificuldades de entender
certos gestos de tempos mais modernos, não necessariamente ligados ao
homossexualismo. Estávamos em meados dos anos 70, com a ditadura comendo
solta, e pouco espaço para a demonstração dos afetos.
O que surpreende é que passados 37 anos do lançamento da canção de
Gil continue a existir uma intolerância e uma irracionalidade que
discrimina e vitima qualquer manifestação de afeto entre homens. Parece
que a sociedade, apesar de toda a luta pela igualdade de direitos, andou
para trás, a ponto de testemunhar barbáries como a recém-acontecida na
Bahia, ironicamente a terra de Gil, em que irmãos gêmeos foram
espancados, um deles até a morte, por andarem abraçados na rua. O jovem
morto, 22 anos, era casado e sua esposa está grávida de quatro meses. O
irmão sobrevivente tem uma filha de quatro anos.
As características do crime covarde, praticado por oito homens,
apontam para homofobia. Um rapaz de 22 anos perdeu a vida por ser
confundido com um gay. Não era o caso. Mas se fosse, o crime continuaria
sendo bárbaro e injustificável. Faz-se necessário um movimento de
pressão para que a reforma do Código Penal em curso não trate mais a
homofobia apenas como injúria. A comissão de notáveis que preparou um
documento para embasar um novo texto, que substituirá o atual, de 1940,
classifica a homofobia como crime inafiançável e imprescritível, como o
racismo. É uma mudança essencial para reduzir e punir devidamente esse
tipo de comportamento.
Embora óbvia e necessária, essa alteração não será aprovada
facilmente pelo Senado e pela Câmara. Entre outros males, o Congresso
brasileiro vem sendo tomado por bancadas de grupos religiosos
retrógrados, contrários a avanços, como o direito da mulher ao aborto, a
eutanásia e a criminalização da homofobia. Chega a pasmar assistir à
manifestação de representantes dessas bancadas, afirmando que punir a
homofobia atenta contra a liberdade de expressão deles. O que querem? O
direito de pregar o preconceito e estimular espancamentos como que acaba
de ocorrer na Bahia?
A sociedade brasileira, fraterna e caracterizada pela tolerância,
precisa combater esses grupos e fazer aprovar um Código Penal que
respeite plenamente os direitos da pessoa humana, sem estar sujeita a
credos. Desde já, apoio qualquer movimento neste sentido, no mínimo pela
liberdade de poder beijar meus filhos adultos na rua, como fazia com
meu pai, sem que isso implique risco de vida.
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Com efeito, esta canção surpreendente tem versos instigadores e belíssimos, e foi muito bem lembrada pelo autor do texto.
Num dos melhores discos de Gil, recheado de canções memoráveis e definitivas (Refazenda, Jeca Total, dentre outras), esta delicada canção é uma das minhas favoritas.
Ouçam Pai e Mãe e deleitem-se.
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