Presidente Lula e cantora Miúcha tendo ao fundo o petroleiro Sergio Buarque de Holanda. Foto: Ricardo Stuckert/PR |
Eu visito Carta Maior todos os dias
Marinheiro , marinheiro,
Quero ver você no mar
Eu também sou marinheiro
Eu também sei navegar
Quero ver você no mar
Eu também sou marinheiro
Eu também sei navegar
Geraldo Vandré
Beto Almeida
Muitas
lições podem ser tiradas da retomada da indústria naval no Brasil que
nesta sexta-feira lançou, no Estaleiro Mauá, em Niterói mais uma grande
embarcação ao mar, o navio Sérgio Buarque de Hollanda. Mas, certamente,
deve-se discutir com prioridade que não é possível pensar um Brasil
soberano sem uma indústria naval desenvolvida. Para aqueles que, até
mesmo nas fileiras da esquerda, chegaram a dizer que os candidatos
presidenciais eram todos iguais, eis aqui uma estupenda diferença:
enquanto os neoliberais conseguiram demolir e paralisar uma das mais
expandidas indústrias navais do mundo, a brasileira - fazendo com que
desde 2000 não se produzissem mais navios aqui - o governo Lula acaba
por transformar o setor em fonte geradora de emprego, desenvolvimento
tecnológico, promoção de justiça social e, especialmente, alavanca
indispensável para se alcançar a soberania.
O que pensar de um
país com costa superior a 8 mil e 500 quilômetros sem uma indústria
naval desenvolvida? Eis aí a tarefa dos neoliberais que se ocuparam de
destruir o que havia sido levantado na Era Vargas em particular. O
Brasil chegou a ter a sua empresa estatal no setor, a Loyd Brasileiro, e
a ocupar uma posição de destaque no cenário mundial da construção
naval. A própria navegação de cabotagem teve expressivo desenvolvimento e
nem podia ser diferente. Vargas chegou a criar a frota do álcool e do
petróleo. Com o neoliberalismo dos anos 90 tem início a demolição
devastadora. Ela alcançou todos os pilares estruturais do transporte,
seja ferroviário (privatização da Rede Ferroviária), aéreo (privatização
da Embraer) e o naval, com a privatização do Loyd Brasileiro seguida de
uma programada desindustrialização. O desemprego foi dramático,
generalizado.
Organizadores de derrotas
Demolir a
indústria naval é organizar a dependência, é organizar a derrota de uma
nação. Mais que isto, é programar sua incapacitação para a defesa, pois
sem indústria naval não há como ter também uma Marinha equipada à altura
dos potenciais de riqueza que devem ser defendidos. As autoridades de
defesa já indicaram, em numerosas oportunidades, a situação de
desarmamento em que se encontra e ainda se encontra a Marina Brasileira,
agora em fase de recuperação. É certo que ainda falta muito, porém,
recuperar a indústria naval é condição indispensável para organizar uma
capacidade de defesa do porte das magníficas riquezas que o petróleo
pré-sal representa. Aí está o desafio. Nesta linha de raciocínio podemos
concluir que uma indústria naval recuperada é fator que se junta à Nova
Estratégia de Defesa Nacional.
Há alguns anos, antes da
divulgação da existência do petróleo pré-sal, a imprensa noticiou a
existência de um estranho relatório da CIA indicando que as plataformas
da Petrobrás em alto-mar eram muito vulneráveis a atentados
terroristas. Seria um relatório ou seria uma espécie torta de ameaça,
ainda que velada? Agora, vemos a Quarta Frota dos EUA ser retomada e se
insinuar pelos mares do sull depois de décadas paralisada. Junte-se a
isto, a discussão recente na OTAN sobre a mudança de sua doutrina
militar, cujo raio de operação deverá incluir o Atlântico Sul. De fato,
na situação atual a Marinha não tem ainda as condições para realizar uma
defesa efetiva de todo o potencial de riquezas contido na plataforma
continental brasileira. Esta área, agora ampliada para 350 milhas,
também chamada Amazônia Azul, possui, além de petróleo, gigantescas
reservas de biodiversidade sempre desafiando nossas universidades e os
centros de tecnologia da Marinha para o desenvolvimento das tecnologias
apropriadas ao seu adequado aproveitamento em favor do nosso povo.
Em
resposta à proposta de intervencionismo ampliado da OTAN, o governo
brasileiro, pela voz do Ministro da Defesa, Nelson Jobim, já afirmou que
as nações desta região sul deverão capacitar-se para ter a condição de
dizer NÃO quando chegar a situação de ter que dizê-lo concretamente, ou
seja, tendo capacidade de defesa para fazê-lo. Sem indústria naval, sem
tecnologia própria, sem indústria de defesa, não há como falar de
soberania efetiva.
A retomada da indústria naval, o projeto do
submarino nuclear, o reequipamento da Marinha, e, sobretudo, sua
modernização, são medidas que sintonizam-se plenamente com a
renacionalização da Petrobrás, sua consolidação e com medidas que
recuperam o papel do estado na formulação das diretrizes econômicas. Ou
seja, exatamente ao contrário dos governos neoliberais, para quem o
estado deve ser mínimo. Afinal, ricos não precisam de estado. A
informação de que há centenas de navios e embarcações encomendadas pela
Petrobrás, gerando milhares e milhares de empregos qualificados e com
carteira assinada, reforçam o movimento sindical, a previdência, o
mercado interno. Até mesmo a Escola Técnica do Arsenal de Marinha, que
há 10 anos estava paralisada, voltou a ativa e está formando técnicos
imediatamente contratados pela construção naval. Até a estatal
venezuelana, a PDVSA, tem encomendados no Brasil a construção de 17
embarcações petroleiras. Integração produtiva latino-americana é o outro
ingrediente neste episódio.
Soberania em vários quadrantes
Mas,
para além desta conclusão que liga recuperação naval e soberania, o
lançamento do novo navio, cuja madrinha é a cantora Miúcha, estimula a
reflexão sobre outras medidas necessárias. Se era absurdo um país do
porte do Brasil não tivesse uma indústria naval, também o é não ter sob
controle público a indústria aeronáutica, sobretudo porque a Embraer foi
produto de um esforço da poupança nacional, irresponsavelmente entregue
aos interesses internacionais, quando há todo um potencial de
aproveitamento da aviação regional por desenvolver aqui no Brasil. O
resultado da privatização da Embraer e sua dependência do mercado
internacional foi a demissão de mais de 4 mil trabalhadores da
ex-estatal quando a crise estourou no capitalismo do primeiro mundo.
Certamente, a estratégia deve voltar-se para o mercado interno. Como
disse Lula no lançamento do “Sérgio Buarque de Hollanda” enquanto os EUA
estão perdendo 70 mil empregos, o Brasil está gerando este ano mais de 2
milhões e meio de novos postos de trabalho. Aqui nasce uma nova classe
médica, nos EUA há uma erosão na classe média, que está sendo despejada,
dormindo nas praças públicas... Com a imensidão do Brasil e sem sistema
de transporte ferroviário eficiente - também foi demolido - a
aviação regional poderia receber um grande impulso no Brasil, mas não
sem antes recuperar o controle sobre a Embraer, como está fazendo na
área naval e de petróleo.
Cultura e soberania
Assim
sucessivamente. Todas as medidas neoliberais resultaram em enormes
prejuízos para a poupança popular, ou para a tecnologia nacional, ou
para a soberania. Ou tudo junto. Se fôssemos analisar o cinema, por
exemplo, quando existia a Embrafilme, cerca de 40 por cento do mercado
cinematográfico era ocupado por produção nacional. Bons filmes e maus
filmes, como em todo lado. Mas, havia uma indústria viva, gerando
empregos, absorvendo talentos, renovando-se e superando em linguagem e
em capacidade produtiva. O fim da Embrafilme jogou o cinema brasileiro
no chão. Sob aplausos do cinema norte-americano que passou a ocupar 95
por cento do mercado brasileiro. E cinema também é soberania, como parte
da construção da identidade nacional.
A retomada da indústria
naval, do papel protagonista do estado, são medidas inequivocamente
necessárias. E respondem concretamente aos sinais de aprofundamento da
crise nos centros do capitalismo. E bem sabemos, pela história, que as
crises mais agudas do capitalismo tendem a buscar superação na economia
de guerra. Por isto o intervencionismo crescente, sem que Obama possa
mudar quase nada. Por isso o reforço orçamentário da indústria bélica
dos EUA, a principal rubrica do orçamento, o que equivale a uma ameaça
contra os países que possuem grandes reservas de riqueza, como é o nosso
caso. E ainda não nos recuperamos plenamente da devastadora demolição
organizada pelos neoliberais, um desarmamento unilateral, em favor dos
que pretendem tomar conta dos mares, ignorando soberanias e o direito
dos povos.
Há um conjunto de sinais sombrios indicando que o
mundo cobrará de nós brasileiros a coragem e a rebeldia de João Cândido,
da Revolta da Chibata, o almirante negro da música de Aldir Branco e
João Bosco. Mas, a embarcação do Brasil Nação está encontrando o rumo
certo.
(*) Beto Almeida é membro da Junta Diretiva da Telesur
O ORNITORRINCO pede a palavra para dizer que nestas eleições que a esquerda venceu o que estava em jogo era isso, meninos e meninas. O Brasil de pé, altivo, soberano, ou o Brazil, assim mesmo, com Z, posto de quatro pelo neoliberalismo da direita atrasada, safada e intolerante.
Enquanto a verdadeira disputa era essa, e na verdade continua sendo, pois o terceiro turno está a pleno vapor, a tucanada-esverdeada se benzia na água benta falsificada nos porões serristas e, falanges da Opus Dei e TFP à frente, nos ameaçava com o fogaréu da intolerância religiosa.
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