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O
golpe de 1964 não é apenas passado, nem foi só obra de generais hoje
aposentados e mortos. Quando um deputado diz ter saudade da ditadura,
quando um candidato presidencial se alia a generais de pijama e a
organizações de ultra-direita, quando um ditador é homenageado por uma
turma de formandos de uma escola militar, quando um ministro diz que a
Anistia impede a justiça de apreciar crimes contra a humanidade, não
estamos diante de saudosismos inconsequentes. Estamos vendo e ouvindo
uma parte da elite brasileira dizer o seguinte: quebramos a legalidade e
algum dia poderemos voltar a quebrar.
Muitos
de nossos amigos latino-americanos não conseguem entender por qual
motivo os governos brasileiros pós-ditadura pegaram tão leve com aqueles
que romperam com a legalidade, sequestraram, torturaram, mataram e
desapareceram.
Neste quesito, os
governos pós-ditadura na Argentina, Chile e Uruguai foram muito mais
efetivos no combate aos crimes das ditaduras, do que os governos Sarney,
Collor, FHC e Lula.
Nossos
amigos não entendem, e muitos de nós tampouco entendem, paradoxos como a
convivência, no mesmo governo, de uma presidenta que foi presa e
torturada, com um general para quem fato histórico é codinome para crime
que merece ser perdoado. Ou de ministros que defendem a Comissão da
Verdade, com outros para quem a Lei da Anistia imposta pela ditadura
permite que autores de crimes contra a humanidade escapem de julgamento.
A
persistência desta situação revela, mais do que a força da direita, a
incapacidade que parte da esquerda tem de perceber os riscos que
corremos ao agir desta forma. Afinal, o golpe de 1964 não é apenas
passado, nem foi apenas obra de generais hoje aposentados e mortos.
O
golpe de 1964 foi a resposta dada por uma parte da elite brasileira,
contra um governo progressista. Foi uma das batalhas da guerra travada,
ao longo de todo o século XX, entre as vias conservadora e progressista
de desenvolvimento do capitalismo brasileiro.
A
via conservadora é aquela que desenvolveu o capitalismo, preservando os
piores traços de nosso passado escravista e colonial. A via
progressista é aquela que buscou e busca combinar crescimento
capitalista, com reformas sociais, democracia política e soberania
nacional.
O golpe de 1964 foi
executado por uma coalizão cívico-militar. Os militares foram o partido
armado do grande empresariado, do latifúndio e dos capitais
estrangeiros. Muitas das empresas envolvidas no golpe, ou que cresceram
durante o período da ditadura, seguem atuantes. As Organizações Globo,
por exemplo.
Hoje, prossegue a
guerra entre aquelas duas vias de desenvolvimento. O governo Dilma,
assim como o governo Lula, constituem expressões atuais da via
progressista. E a campanha reacionária feita por Serra, nas eleições
presidenciais de 2012, traduziu os sentimentos e os interesses dos
legítimos defensores da via conservadora (alguns dos quais, é bom dizer,
buscaram e encontraram abrigo do lado de cá).
Quando
um deputado diz ter saudade da ditadura militar, quando um candidato
presidencial se alia a generais de pijama e a organizações de
ultra-direita, quando um ditador é homenageado por uma turma de
formandos de uma escola militar, quando um ministro diz que a Anistia
impede a justiça de apreciar crimes contra a humanidade, não estamos
diante de saudosismos inconsequentes.
Estamos,
isto sim, vendo e ouvindo uma parte da elite brasileira dizer o
seguinte: quebramos a legalidade e algum dia poderemos voltar a quebrar;
desconsideramos a voz das urnas e algum dia poderemos voltar a
desconsiderar.
Uma esquerda que
defende os direitos humanos de maneira consequente, deve lembrar que a
impunidade dos torturadores de ontem, favorece os que hoje torturam
presos ditos comuns. Uma esquerda que defende uma via eleitoral, tem
motivos em dobro para ser implacável contra os que defendem a
legitimidade de golpes. E uma esquerda que se pretende
latinoamericanista precisa lembrar que o golpe de 1964 foi, em certo
sentido, o início de um ciclo ditadorial que se espalhou por todo o
continente.
E que ninguém ache
que golpes são coisas do passado. Honduras, bem como as tentativas
feitas no Equador e Venezuela, Bolivia e Paraguai, mostram que os
Estados Unidos e parte expressiva das elites locais têm uma visão
totalmente instrumental da democracia. E o reacionarismo atual de parte
das chamadas classes médias não deixada nada a dever frente aquele que
mobilizou, em 1964, as marchas com Deus, pela Família e pela
Propriedade.
Por tudo isto, temos
todos os motivos para dar o exemplo. Como nossos amigos de outros
países da América Latina, não devemos temer, não podemos esquecer e não
podemos perdoar.
Valter Pomar é membro do Diretório Nacional do PT
By: Carta Maior
Um comentário:
Vá merda seu comuna nojento!
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