Gilson Sampaio é sempre certeiro
Sanguessugado do Informação Incorrecta
Muito bem pessoal, pegamos numa calculadora. Imaginemos uma dívida pública de 2.000.000.000.000 (dois mil biliões), uma taxa de juro de 7% e, como unidade de medida, as gerações (mais ou menos 25 anos).
Eis as prestações para extinguir a dívida:
com prestação anual de 172 biliões (172.000 milhões) = uma geração
com prestação anual de 145 biliões (145.000 milhões) = duas gerações
com prestação anual de 140 biliões (145.000 milhões) = 6 gerações.
Fui eu que fiz estas contas? Não, caso contrário este artigo teria sido publicado em Junho de 2024. Mas o que impressiona é o seguinte: 6 gerações? Exacto, mais ou menos 150 anos. Sempre que seja possível pagar 140.000.000.000 por ano. Porque no caso de Italia, por exemplo, País com uma dívida de 2.000 biliões de Euros, o PIB anual é inferior; isso é, a riqueza produzida ao longo dum inteiro ano não chega para atingir o valor da dívida.
E no caso de outros Países? Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha? Nestes casos a dívida absoluta é quase sempre inferior, mas também o PIB, a riqueza produzida.
Na Grécia o rácio dívida/PIB é de 142%. Isso é: num ano, a Grécia não produz o suficiente para atingir a dívida (isso seria 100%) e ainda falta uns bons 42%.
Na Irlanda o rácio é de 94 %, em Portugal 92%, na Espanha é de 60%.
E na América do Sul?
No Brasil é de 66 %, o valor mais elevado do continente, superior ao da Espanha. Os outros Países apresentam valores mais baixos: Argentina 49%, Chile 9%, Colômbia 36%, Equador 20%, Paraguay 15%, Peru 15%, Uruguay 57%, Venezuela 38%.
Acabemos com os Estados Unidos: 94%.
(Todos os valores apresentados até agora são arredondados e constam no relatório do FMI de Abril de 2011).
Quantos Países poderão objectivamente pagar a própria dívida? Poucos, bem poucos. Porque há outro valor a considerar. E para percebe-lo podemos observar o caso do Reino Unido.
Oficialmente o rácio dívida/PIB de Londres é de 81%. Mas este dado não tem em conta a dívida dos privados (nenhum dos dados anteriores tinha em conta este valor): ao somar dívida pública com dívida privada, o rácio dívida/PIB do Reino Unido é de 280%.
Maior do que a Italia (246%), por exemplo, e maior do que a média europeia (260%).
A verdade é que nem a Alemanha (76%) seria capaz de repagar a própria dívida, em particular se um ou mais Países da Europa do Sul piorasse a própria situação.
Estas dívidas existem para não ser pagas.
Claro, depois há Leitores que acham que a solução deveria ser "levantar o traseiro e ir trabalhar". Mas se a ideia é não dizer apenas idiotices, então temos de admitir que a situação é preocupante e não é um exclusivo da Europa; é só espreitar a lista do FMI e observar quantos Países apresentam um rácio entre dívida (pública, sem a privada) e PIB mais perto dos 100% do que dos 0%.
Um quarto da riqueza do mundo
O ano dos Maias das finanças globais é caracterizado pelo facto que em 2012 serão refinanciados Títulos de Estado para um valor de 11.500.000.000.000 (11.500 biliões) de Euros, equivalente a um sexto do PIB mundial. Os bancos europeus possuem títulos para um total de 800 biliões de Euros.
Mas além disso existem os prazos dos títulos das empresas: outros 800 biliões, sempre na Europa. E, claro está, há também os bancos americanos e asiáticos. A moral é que será preciso quase um quarto do PIB mundial para atender a essa necessidade financeira.
Obviamente, se a dívida aumentar, o dinheiro necessário será mais. Não é uma coincidência se as medidas "lágrimas e sangue" introduzidas no Velho Continente foram aplicadas mesmo agora, em 2012 e não em 2013 ou 2014.
É por isso que Berlusconi foi substituído na passagem de 2011 para 2012, tal como aconteceu com o Primeiro Ministro espanhol, grego e português (este último um pouco mais cedo, mas sempre nos últimos 9 meses). Os bancos conhecem a situação, muito bem, e sabem que a única estrada para não entrar num colapso global (e este sim que abrangeria todas as economias mundiais, sem excepção) é limitar ao máximo as despesas dos Estados, mesmo que isso signifique o sofrimento de inteiros povos (este não é um grave problema na óptica das instituições financeiras).
Mas os problemas não ficam resolvidos com algumas figuras públicas removidas na Europa: 70% da dívida pública do planeta é composta pelas dívidas do Japão e dos Estados Unidos. Tokio precisa de 3.500 biliões, Washington 4.500.
Um problema nipo-americano? Não é bem assim: apenas um problema americano.
Por enquanto não vamos explicar a razão, mas deixo uma pergunta "no ar": como é possível que a economia dum País com um rácio dívida pública/PIB (sem contar a dívida privada) de 234% seja considerada "saudável" enquanto um País com um rácio de 92% está falido? O primeiro País é mesmo o Japão, o segundo é Portugal. Não é uma pergunta retórica esta, há uma explicação que é bem interessante.
A solução?
Portanto eis a situação: a maioria dos Países apresenta níveis de dívida pública muito elevados, sem possibilidade realista de serem pagos. A considerar a dívida dos privados o quadro piora ainda e os Países que poderiam devolver as próprias dívidas são verdadeiramente poucos.
Este ano há ainda a necessidade de utilizar 11.500 biliões de Euros, para renovar os Títulos cujos prazos estão a acabar: um sexto do PIB mundial, um quarto se o desejo for renovar também os Títulos das empresas privadas.
Soluções? Duas.
A primeira seria injectar dinheiro fresco nos mercados. Abrir os cordões das bolsas, fazer investimentos que produzem trabalho e riqueza. Mas os bancos têm medo e, sobretudo, não têm dinheiro. E sem dinheiro, como fazer investimentos?
Portanto há a segunda solução, já utilizada em 1941 pelos Estados Unidos. Solução simples, que cria trabalho, diminui (fisicamente) o número de desempregados e abre novas e emocionantes perspectivas para o futuro.
Claro, sendo esta última solução a guerra, é preciso chegar até o futuro. Mas como solução funciona. Ou não foi o General Wesley Clark que viu o programa no Pentágono? Iraque, Líbia, Síria, Irão...
Ipse dixit.
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O Ornitorrinco Envelhecido pede licença para lembrar que, nos anos 80, nossa brava CUT bradava palavras de ordem de aberta e total oposição ao pagamento da dívida externa. Lembro do hoje ministro Mercadante, naqueles tempos românticos formidável assessor da Executiva, explicando aos membros da Direção Nacional da Central as razões pelas quais a patifaria da dívida não poderia, não deveria e não seria, jamais, paga. Eu estava lá e, em que pese minhas poucas luzes, entendia, creio, as coisas todas.
Salvo melhor juízo estamos e permanecemos, de um lado, reféns da voracidade criminosa dos rentistas nacionais e estrangeiros - o que não é novidade, é claro - e, de outra banda, daquilo que o PTzão Nacional e seus próceres mais acintosamente lampeiros, sempre prontos a prestar estranhas e muito bem remuneradas "consultorias", chamam de governabilidade, e esta é a dolorosa novidade.
Na parede da memória as lembranças são dolorosas feridas abertas.
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