Copiei do FB de Ronaldo Santos Costa
Nada me impressiona mais, em minhas idas aos presídios, que as filas de mulheres ao lado de fora deles. Mulheres simples, com trajes simples, fisionomias sofridas e sacolas nas mãos. As filas começam a formar-se de madrugada, por volta das 05:00, embora as visitas iniciem-se bem mais tarde, em horário comercial. É preciso chegar cedo para aproveitar ao máximo o tempo ao lado do filho ou do marido preso. Cada minuto é importante. Só quem ama, sabe.
A imagem da Penitenciária Central do Estado impressiona já da rodovia que a circunda. Impressiona pelo tamanho. Impressiona pelo ar sombrio. Impressiona pelo retrato de abandono material. Impressiona pelo colorido sem graça das roupas penduradas nas janelas das celas. Impressiona pela estrada de saibro esburacada que dá acesso ao complexo penitenciário, que já anuncia -e também denuncia- o descaso material que se verá adiante. Impressiona pela fila feminina, frágil e forte, a um só tempo. Impressiona, sempre e sempre, a mensagem avistada por Virgílio, na entrada do inferno, e que invariavelmente me vem à memória, toda vez que passo por aquele malsinado portão: "deixai toda a esperança, vós que entrais".
Nunca vi filas de homens, embora o presídio feminino ladeie o masculino. Mulheres presas quase nunca recebem visitas dos maridos, embora homens presos quase sempre recebam visitas das esposas. As mulheres ocultam, sob a falsa aparência de fragilidade, uma força e uma resiliência que homem algum possui. Talvez porque somente elas possuem o dom da maternidade. Talvez porque somente uma mãe conheça, no sentido mais amplo, completo e irrestrito, o significado da palavra amor.
Por que escrevi isso, em tom piegas, às seis da manhã? Porque dormi cedo, acordei também muito cedo, e não consegui mais dormir, após ler uma enxurrada de comentários raivosos sobre a proibição da revista vexatória nas mulheres, nas entradas dos presídios. As dezenas de comentários, quase todos de pessoas versadas em Direito -foi o que mais me assustou-, transbordavam de ódio e ignorância. Defendiam que mulheres que acordam as 03:00, tomam vários ônibus lotados, não raro em jejum, aguardam por horas ao lado de fora, em pé, por vezes sujeitas às inconstância do tempo, sejam expostas às mais humilhantes situações, para ter acesso aos presídios. E o faziam com certo regozijo mórbido, alegando que mereciam aquela espécie de tratamento hediondo por serem parentes de bandidos.
Mais do que as palavras duras, o que causou espécie foi o gozo. Saber que pessoas gozam com a humilhação de mulheres me deu dor de estômago. Saber que bacharéis em Direito gozam com a humilhação de uma mãe inocente me deu nojo do que nos tornamos. Sentir prazer em saber que uma senhora baixa suas roupas íntimas e abre sua genitália, com as mãos, de frente e de costas, subindo e descendo, por três vezes, na frente de pessoa estranha, para muito além de sadismo, revela doença. Nossa sociedade está doente há muito. A Internet e a ausência de pudores que lhe é peculiar apenas nos mostra o quanto.
"Se usou - a vagina - para fazer bandido, não tem que ter vergonha de mostrar para visitá-lo". Foi a pior que li. E parei por ali.
Acho que chegamos ao ápice da involução humana! Não sei quanto a vocês, mas a minha esperança eu deixei do lado de fora. E já há algum tempo, infelizmente...
2 comentários:
Que texto triste e cruel meu amigo. Lembro da minha tia que deve ter passado por isso tantas vezes. Seu filho preso por uso e porte de drogas a levou muitas vezes a essa humilhação. Infelizmente sou obrigada a concordar com vc. A desumanidade de muitos nos deixa sem esperança! ��
Levando em conta que a quimera comentarista se formou na escola tradicional é possível projetar os profissionais que se formarão no Escola sem política. A quimera comentarista ainda por cima é um aborto da natureza.
Postar um comentário