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Como enganar o freguês
O Estadão publica agora à noite uma matéria que é um primor na arte de enganar o freguês.
Já começa do título: Brasil é nº 1 em encargos trabalhistas.
E o texto começa com aquele estilo de abertura de Jornal Nacional:
“Confirmado: o Brasil é mesmo o campeão mundial dos encargos
trabalhistas.”.
E, daí por diante, reproduz os dados de uma pesquisa da Fiesp, que
mostrariam que, proporcionalmente, os encargos pagos pelas empresas
sobre os salários dos trabalhadores no Brasil seriam a fonte da falta de
competitividade da indústria brasileira frente aos concorrentes
estrangeiros.
Ninguém duvida que essa legislação tem que ser revista e os encargos,
em boa parte, devem ser transferidos da folha de pagamentos para o
faturamento das empresas, como forma de tornar justa a contribuição
social, sem castigar quem emprega muito para faturar relativamente pouco
e tributando quem ganha muito sem gerar emprego em quantidade
significativa, como o setor financeiro.
Mas a matéria passa longe disso. E é um tal de dizer que se paga mais
aqui do que em Taiwan, na Argentina, na Coreia do Sul e no México.
Seriam 32,4% de encargos, contra uma média de 21,4% nos 34 países
estudados.
E, então, um parágrafo que é uma pérola da coleção de “verdades absolutas e indiscutíveis”.
“Apesar de o título brasileiro de campeão mundial já estar
consolidado há um bom tempo no debate econômico, faltavam informações
sobre a representatividade dos encargos trabalhistas no custo da mão de
obra em um conjunto de países.”
E aí, o mais chocante: por conta da valorização do real, os nossos
encargos subiram, em dólar, de 2004 a 2009, 119,5%. Infinitamente mais
que na Coreia, onde subiram 1,2%, medidos na moeda americana.
Que coisa, não é? A culpa da falta de competitividade é deste
malandro, o trabalhador, que tem direitos demais e deste Estado,
parternalista, que foi inventar estas coisas como previdência, FGTS,
seguro contra acidentes de trabalho…
Mas aí, no penúltimo parágrafo, quando o freguês já “comprou” a
história e “já foi embora” da reportagem, dizendo que “este país não
tem jeito”, vem o dado que revela toda a “armação”.
É que os encargos trabalhistas no Brasil, mesmo sendo
proporcionalmente altos, incidem sobre os salários muito baixos que são
pagos aos nossos trabalhadores. E que no “campeão” dos encargos
trabalhistas, eles custam menos da metade (US$ 2,70 a hora) do que a
média dos 34 países pesquisados, que é de US$ 5,80 a hora.
- Ué, mas se pagamos menos da metade, em dólar, como é que podem
ser os encargos a razão de nossos produtos custarem mais, no mesmo
dólar? – pergunta o cordeiro ao lobo.
Irrelevante, diz o lobo. Vocês, trabalhadores, são os culpados de tudo.
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