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Antonina, Litoral do Paraná, Palestine
Petroleiro aposentado e petista no exílio, usuário dos óculos de pangloss, da gloriosa pomada belladona, da emulsão scott e das pílulas do doutor ross, considero o suflê de chuchu apenas vã tentativa de assar o ar e, erguido em retumbante sucesso físico, descobri que uma batata distraída não passa de um tubérculo desatento. Entre sinos bimbalhantes, pássaros pipilantes, vereadores esotéricos, profetas do passado e áulicos feitos na china, persigo o consenso alegórico e meus dias escorrem em relativo sossego. Comendo minhas goiabinhas regulamentares, busco a tranqüilidade siamesa e quero ser presidente por um dia para assim entender as aflições das camadas menos favorecidas pelas propinas democráticas.

sábado, 25 de dezembro de 2010

Cadeia para quem precisa de cadeia

O país da cordialidade se recusa a julgar graves crimes contra a humanidade 
da época da ditadura, mas avança no encarceramento de seus jovens.

Enquanto isso, na Argentina, um ex-presidente e 89 torturadores condenados, 
depois da revogação do "Punto Final".


Eu visito Sem Juízo todos os dias

Reportagem da Opera Mundi contabiliza 89 condenações de torturadores do regime militar na Argentina, neste último ano.
Não é preciso ser expert em matemática para chegar ao resultado brasileiro: Zero.
Zero neste ano. Zero nos anteriores. E, a depender do STF, zero também nos próximos.
A questão está longe de representar o escore de um campeonato. Justiça não é esporte e as condenações não são gols. Afinal, absolvições também representam realização de justiça.
A questão é de princípios.
A Justiça brasileira entendeu que nossa lei de anistia é um ponto final, inclusive para crimes não conexos aos políticos, cometidos pelos agentes da repressão. Aqueles que, diferentemente dos outros, não foram presos, não foram banidos, não foram julgados.
A Suprema Corte Argentina assim se pronunciou, em 2005, sobre o Punto Final:
“Na medida em que as anistias se orientam ao ‘esquecimento’ de graves violações de direitos humanos, elas se opõem às disposições da Convenção Americana sobre Direitos Humanos e do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e são, portanto, constitucionalmente intoleráveis.
Na medida em que as leis de anistia obstaculizam o esclarecimento e a efetiva punição de atos contrários aos direitos reconhecidos nos tratados mencionados, impedem o cumprimento do dever de garantia com que se comprometeu o Estado argentino, e são inadmissíveis.
Toda a regulamentação de direito interno que, invocando razões de ‘pacificação’, disponha a concessão de qualquer forma de anistia que deixa impunes violações graves dos direitos humanos, cometidas pelo regime que a disposição beneficia, é contrária a claras e obrigatórias disposições do Direito Internacional e deve ser efetivamente suprimida”.
Tais dispositivos foram mencionados na decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos que condenou o Estado brasileiro no caso Araguaia. Nós éramos réus; eles, jurisprudência.
Nosso STF chegou à conclusão de que a anistia, mesmo aprovada durante o regime militar, foi resultado de um grande acordo nacional. Disse também que o brasileiro é um povo cordial e a ausência de julgamento, enfim, é o preço pago pelo retorno à democracia. Ou seja, devemos nos dar por muito satisfeitos por ter conseguido chegar até aqui.
Dezenas de brasileiros, porém, ainda estão desaparecidos.
Da mesma forma como não tiveram direito de defesa por suas detenções ilegais, seus familiares não puderam contestar na justiça as irregularidades de suas situações. Supostamente mortos, seus corpos jamais puderam ser enterrados.
Pela permanência da indefinição, o tribunal da OEA entendeu que tais violações persistem e ainda podem ser julgadas.
Pela dimensão da desproteção, considerou que tais crimes fazem parte do rol de lesa-humanidade, que não admitem perdão nem esquecimento.
Uma semana depois do julgamento em que a omissão brasileira com a tortura oficial foi exposta internacionalmente, o ex-presidente argentino Rafael Videla foi condenado à prisão perpétua, pelos crimes lá praticados.
Idêntico destino teve Júlio Simon, um torturador peculiar.
“Conhecido como ‘El Turco’, costumava estuprar prisioneiras na frente dos maridos. Simón dizia que ‘não era um monstro’ e cometia a violência sexual ‘pela pátria’.
O policial se definia como "Deus da vida e da morte" e ficou famoso pelo sadismo com que torturava os prisioneiros judeus, empalados com um cabo de vassoura, e deficientes físicos, atirados do alto de escadas. Durante as sessões de tortura, o policial utilizava uma braçadeira com uma suástica, ouvia marchas alemãs e discursos gravados de Adolf Hitler. Ele participou também do sequestro de filhos de prisioneiras políticas, entregues a militares e simpatizantes do regime” (site Última Instância).
Enquanto isso, na terra da cordialidade, militares e policiais ocupam os morros cariocas e vasculham residências de favelados indiscriminadamente; os níveis de encarceramento crescem de forma assustadora, atingindo majoritariamente jovens pobres e pardos; presos indultados recebem de Natal pulseiras eletrônicas, para carregar um pouco da prisão para dentro de suas casas.

Cadeia para quem precisa de cadeia.

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